A popularização dos veículos elétricos no Brasil é um movimento sem volta. A cada novo projeto residencial, principalmente em condomínios de padrão médio e alto, a pergunta aparece: “Você já deixou uma tomada para carro elétrico na garagem?”

A boa notícia é que muitos já estão pensando nisso. A má notícia: “deixar uma tomada” não resolve.

Em projetos residenciais recentes, observa-se o mesmo erro se repetindo: clientes comprando carros elétricos e descobrindo que sua instalação elétrica não suporta a carga necessária para uma recarga eficiente.

O problema não é apenas dimensionar um circuito novo. É entender que se trata de cargas entre 7,4kW e 22kW operando por horas consecutivas – algo que a maioria das residências brasileiras não foi projetada para suportar.

Os Níveis de Recarga e Suas Implicações Técnicas

Nível 1 – Tomada Comum (10A/16A)

Nível 2 – Wallbox Residencial (32A)

1. ⚡ Carga adicional = quadro preparado

O primeiro passo é avaliar a capacidade do quadro de distribuição. Um carregador veicular típico pode exigir entre 3,7 kW e 7,4 kW (modelos mais simples, monofásicos ou bifásicos), com correntes variando de 16 A a 32 A.

Mas a diferença entre a potência nominal e o consumo real durante o processo de recarga é um aspecto que merece atenção técnica especializada:

Análise da Demanda Total Não basta somar a potência do carregador à instalação existente. É preciso considerar o fator de simultaneidade e a curva de demanda residencial típica.

Infraestrutura Elétrica Existente

➡️ Isso exige reserva de carga e planejamento no dimensionamento do quadro geral e da entrada de energia.

Referência normativa: NBR 5410, seção 4.2 e 6.2.5

2. 🔌 Circuito dedicado: obrigatório

Nada de puxar uma tomada da rede geral ou da iluminação da garagem. A tomada (ou carregador) precisa de um circuito exclusivo, com disjuntor próprio, dimensionado para a carga contínua e o tempo de operação do carregamento.

Cabeamento e Proteções para wallbox de 32A:

Referência normativa: NBR 5410 – seção 6.2.5.2

3. 🌡️ Cabos e proteções adequados à carga contínua

Os cabos devem ser compatíveis com a corrente nominal do carregador, levando em conta:

Também é obrigatório prever dispositivos de proteção contra sobrecorrente e, se necessário, contra fuga à terra (DR).

Referência normativa: NBR 5410 – seções 6.3.5.2 e 6.2.7 Norma complementar: NBR IEC 61851

4. 📏 Atenção à queda de tensão

Em alguns casos, o ponto de carga fica longe do quadro principal (ex: garagem afastada). A queda de tensão máxima permitida é de 4% (segundo a NBR 5410). Isso pode obrigar a aumentar a bitola dos condutores — algo que deve ser calculado no projeto.

Referência normativa: NBR 5410 – seção 6.2.7.2.2

5. 🔋 Prever hoje, mesmo que só vá usar amanhã

Mesmo que o cliente ainda não tenha um carro elétrico, o ideal é prever o ponto no projeto desde já.

Aspectos Práticos Para o Projeto:

Isso evita retrabalho, quebras e custos futuros. Pode ser apenas um eletroduto com espaço livre, uma prumada extra, um quadro reserva. Mas deve estar no projeto.

Referência normativa: NBR 5410 – seção 4.2.3.6

Erros Técnicos Comuns na Prática Profissional

Erro 1: Instalar tomada industrial comum para carregador Consequência: Aquecimento, desarme de proteções, risco de incêndio

Erro 2: Subdimensionar o neutro em instalações trifásicas Consequência: Desequilíbrio, aquecimento do neutro, falhas intermitentes

Erro 3: Ignorar a necessidade de comunicação entre carregador e veículo Consequência: Recarga incompleta, proteções não atuam adequadamente

Normas e Regulamentações

A NBR 17019:2022 estabelece os requisitos para instalação de carregadores de veículos elétricos, complementada pela NBR IEC 61851 que define diretrizes para instalação e operação de estações de recarga. Pontos críticos:

👷♂️ Conclusão: engenharia pensada para o futuro

Projetar com visão de longo prazo é parte da boa engenharia. E quando se fala de veículos elétricos, não se trata de “se” o cliente vai precisar — é quando.

A infraestrutura elétrica para eletromobilidade residencial não é mais um diferencial. É uma necessidade real, técnica e normativa.

Como profissionais da construção civil, o papel é garantir que essa previsão esteja correta, segura e eficiente desde a planta.

A diferença entre um projeto bem executado e um problema futuro está nos detalhes técnicos que apenas a experiência prática pode ensinar.